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Estratégia & Marketing Postado em terça-feira, 03 de outubro de 2017 às 21:02
Daniel nunca pensou em ser empreendedor. Mas, de certa forma, sempre acreditou no poder das ideias doidas. Aos 11 anos, quando ainda morava em Los Angeles, recebeu a tarefa de entrevistar alguém que respeitasse muito, para contar a história dessa pessoa em um trabalho de escola. A maioria dos seus colegas entrevistou o pai, o avô ou um tio próximo. Mas Daniel tinha alguém diferente em mente: Don Drysdale, o maior jogador de basebol dos Dodgers na época.

Seria como tentar entrevistar o Neymar, quando você pode simplesmente conversar com um vizinho e entregar o trabalho. Para isso, ele escreveu uma carta contando do projeto da escola, e oferecendo a mesada de um ano inteiro — o que daria 12 dólares — para que Don aceitasse o convite. Colocou a carta no Correio e ficou na torcida.

Um belo dia, o telefone toca. “O Daniel está em casa?” Era Don Drysdale na linha. Ele tinha topado fazer a entrevista no dia seguinte no Estádio dos Dodgers — e nem pediu a mesada em troca.

“Foram momentos como esses que me inspiraram a acreditar que vale a pena tentar fazer coisas extraordinárias”, conta Daniel.

“Meus pais sempre me ajudaram a ver que, na pior das hipóteses, você pode não conseguir. Mas existe uma pequena chance de acabar fazendo algo grandioso.”

Descobrindo o BrasilSua formação e suas decisões profissionais levaram Daniel a se tornar um investidor de Private Equity no famoso fundo de investimentos Warburg Pincus. Em um dado momento, o fundo estava analisando as oportunidades de abrir uma filial no Brasil e deixou Daniel encarregado de estudar o mercado. A pergunta que ele deveria responder é:

“Se você tivesse alguns bilhões de dólares, onde investiria no Brasil?”

Daniel analisava estudos, olhava as projeções e, cada dia mais, tinha uma certeza: não faltavam oportunidades. O ano era 2010 e o Brasil tinha acabado de sair na capa da The Economist como uma promessa para o mundo.

“Ficou muito claro que, daqui 50 anos, o Brasil vai ganhar um protagonismo muito maior na economia por diversos fatores. O primeiro é a demografia e o envelhecimento da população, um dos principais elementos de evolução de uma economia. Existe também uma tendência de crescimento na renda dos brasileiros, com a emergência de uma nova classe média. Sem contar os recursos naturais que não exploramos e que são extremamente valiosos.”

Com esse cenário positivo, Daniel se encheu de entusiasmo. Decidiu bater na porta do escritório do líder responsável por essa expansão internacional, com a intenção de se candidatar a ser o “country manager” da operação no Brasil. Ele, ouvindo o relato de Daniel, foi direto ao ponto:

– Daniel, você não fala português. Não entende nada da cultura. Não dá, gringos não conseguem fazer negócio no Brasil. Infelizmente, minha resposta é não.

“Saí de lá bravo. E falei: ‘Agora tenho que mostrar que ele está errado. Pedi demissão, arrumei as malas e desembarquei no Brasil.”

Rumo ao Novo Mundo“Uma semana depois de pedir demissão, eu pensei: ‘Caraca, o que foi que eu fiz?” Não tinha volta. Então o único caminho era seguir em frente. Daniel decidiu passar um tempo em Florianópolis para aprender português. Mas teve que aprender tudo, literalmente, sozinho. Até para tirar o visto de permanência no Brasil, ninguém sabia como ajudá-lo.

“Eu fazia o que a maioria das pessoas não tinha feito ainda. Conseguir um visto brasileiro para empreender no país… E não existiam pessoas que eu poderia acessar pra entender quais eram os caminhos.”

O que restava a Daniel era estudar. Ele não sabia muito de marketing, então começou a ler vários livros. Não sabia como programar, e aprendeu algumas linguagens para criar o site do seu novo negócio. Ia conhecendo a cultura e aprendendo português, em paralelo. E tudo isso foi fortalecendo a crença de que ele seria capaz de fazer qualquer coisa por aprender.

Enxergando de longe as oportunidades

Viajando por dentro de lugares diversos do Brasil, Daniel ia descobrindo algumas coisas que, para quem via de fora, eram bastante chocantes. A primeira era a relação entre marcas e consumidores.

“A qualidade de muito serviço oferecido no Brasil gerencia a expectativa de forma errada. Por algum motivo, tem muita surpresa negativa e quase nunca surpreende positivamente. O Marketing fala muito e raramente entrega. Nos EUA, se você faz uma promessa e não cumpre, sua marca se queima. Mas aqui os consumidores já se acostumaram com isso.”

Em meio às suas pesquisas, Daniel conheceu algo que nunca tinha visto em nenhum outro lugar, um site em que consumidores poderiam reclamar abertamente do serviço e atendimento das empresas: o Reclame Aqui. Foi aí que ele percebeu como grande parte das empresas era odiada por aqui. Em especial, dois setores figuravam na lista de maior insatisfação: o de telefonia e o de seguros.

Opa, ali tinha uma oportunidade!

Somado a isso, ele notou como os celulares no Brasil são muito mais caros que no resto do mundo, chegando a custar três ou quatro vezes mais do que nos EUA. Mas a ironia era que, mesmo custando mais, quase ninguém fazia o seguro contra acidentes, roubos ou defeitos, já que os preços são praticamente proibitivos. Se a tela do seu celular já quebrou, você sabe bem o que acontece: a única solução parece ser deixar na assistência técnica durante 30 ou 60 dias até ter seu aparelho de volta.

Ser amada em uma indústria com tanta insatisfação
Foi para solucionar esse problema que nasceu a Pitzi, uma empresa centrada no consumidor que oferece aos clientes um plano de proteção contra acidentes, garantindo o envio do seu telefone perfeito em até 5 dias úteis.

No começo, era simples: ele recebia o telefone, e se fosse impossível consertar, ia à loja da frente, comprava um novo, entregava ao cliente e depois tentava descobrir como consertá-lo para revender como usado. Com o tempo, foi desenvolvendo a logística reversa, verticalizando a operação e construindo uma fábrica própria que melhorasse a eficiência da sua cadeia. Hoje, além de assegurar contra acidentes, a Pitzi também está ampliando sua proteção contra roubos e furtos em parceria com seguradoras.

Na prática, a Pitzi é um serviço de assinatura com uma mensalidade que varia de acordo com o modelo do aparelho que repara seu celular em caso de queda, dano ou defeito. O suporte para smartphones é feito sem que os assinantes precisem sair de casa, usando um serviço online para fazer o chamado.

Fazer uma mudança ou inventar a lâmpada?De todos os desafios e dificuldades que Daniel já enfrentou no Brasil, alguns aprendizados ficaram mais fortes.

“No começo, eu imaginava que criar um novo negócio era como fazer uma mudança de um apartamento para o outro. Muito trabalho a ser feito, mas com esforço você consegue aos poucos e ver o progresso. Você tem que empacotar suas coisas sozinho, colocar tudo no carro, fazer uma viagem, voltar e colocar mais coisas… Até que um dia tudo já foi trocado de um lado para o outro. Um trabalho constante que não pode ser feito por mais ninguém, além de você.”

“Mas, na prática, é muito mais como a descoberta de uma invenção. Para criar uma lâmpada que funcionasse, foi preciso testar milhares de lâmpadas que deram errado. Na história da Pitzi, nós descobrimos três ou quatro lâmpadas, mas, para isso, tivemos que testar milhares de coisas.”

“O segredo é fazer muitos experimentos, ser muito bom em executá-los e ganhar tempo e velocidade, sem perder a qualidade desses testes. Até encontrar uma lâmpada que funcione.”

Mas como você sabe que chegou em algo que realmente tem potencial e indica o caminho certo?

“É bastante óbvio, como uma explosão. A nossa primeira, por exemplo, foi quando estávamos testando diferentes canais de distribuição. Testamos sites online, assistências técnicas, tudo parecia muito difícil. Até que conseguimos entrar em uma loja física e a Pitzi praticamente se vendeu sozinha. Ali descobrimos nossa primeira lâmpada.”

Ciclo virtuoso

Para Daniel, empreendedorismo é uma força poderosa para o bem. A maioria das pessoas acredita que empreender é uma forma de ganhar dinheiro e acaba criando um ciclo vicioso em que ganham dinheiro prometendo algo que não podem cumprir. Mas Daniel quer mostrar o poder do ciclo virtuoso — a criação de uma marca com credibilidade que entregue ao consumidor aquilo que ele espera. Essa reputação ao longo do tempo fortalece também os aspectos financeiros, o que ajuda a inovar mais rápido, vender mais e fazer mais pessoas felizes.

“Esse é um ciclo muito poderoso, e a Pitzi tem sido exemplo disso. Entramos em um setor comoditizado e estamos, aos poucos, fazendo um bom trabalho, que possa ser reconhecido e crescer. Minha intenção é levar esse ciclo virtuoso também para outros produtos, setores e lugares. Queremos criar uma nova barra de atendimento, qualidade e serviço no Brasil. Se o cliente começa a perceber que dá para ser mais rápido e melhor, não vai aceitar alguém que entregue menos do que isso.”

O tamanho do sonho, a capacidade de realizar algo grandioso e a vontade de transformar a relação entre marcas e empresas no Brasil fizeram de Daniel Hatkoff o mais novo Empreendedor Endeavor, aprovado no 74° Painel Internacional, que aconteceu no último dia 13/9, em Nova York.

“Se sonhar grande e sonhar pequeno dá o mesmo trabalho, nós decidimos sonhar grande. Bora fazer algo doido.”

Fonte: Endeavor
Estratégia & Marketing Postado em terça-feira, 12 de setembro de 2017 às 21:09
De tudo o que está acontecendo na sua empresa hoje, o que é mais importante você olhar de perto?

Em uma das mentorias que participei, um empreendedor de uma empresa da área de saúde estava preocupado porque alguém tinha lhe falado que ele precisava realizar um exercício de estratégia. Ele, portanto, queria saber exatamente o que deveria fazer. Pedi que ele esquecesse estratégia por um momento. Perguntei primeiro sobre o seu negócio e quais eram suas preocupações. Logo notei que, de fato, ele não precisava de nenhuma estratégia.

Sua empresa tinha produtos de altíssima qualidade a preços competitivos e margens atraentes, mas pouquíssimos clientes, já que ele tinha crescido por meio dos relacionamentos pessoais que cultivou em sua carreira como profissional de saúde. O que o preocupava era como ele poderia criar uma força de vendas que pudesse ampliar mercados, trazer novos clientes e aumentar a receita do seu negócio.

Isso fazia muito sentido. Como ele nunca tinha tido uma equipe de vendas, é fácil imaginar a quantidade de coisas que ele precisava aprender e executar para criar uma: definir perfil de vendedores, estrutura de vendas, um plano de vendas, se é por geografia ou por contas, sistemas de gestão etc. Então, estava claro o que se precisava fazer.

Fico imaginando o que empresas relativamente pequenas, com recursos limitados, vão fazer com muitas análises e variáveis intermináveis que muitos desses exercícios estratégicos geram. O grande risco é que eles possam distrair a organização de onde ela deveria focar sua energia, nesse caso, uma empresa com menos de 100 funcionários criando uma área nova e fundamental.

Então duas primeiras observações que quero ressaltar, e que os empreendedores devem tomar cuidado:

1) O que é “pensar mais na estratégia”?Empreendedores devem com certeza refletir se as escolhas que estão fazendo para suas empresas seguem uma lógica coerente, quais os gargalos que têm de ser eliminados e, acima de tudo, se existem o foco e os recursos necessários para executar as ações decorrentes desse raciocínio. Podemos chamar talvez isso de “pensar na estratégia”.

Mas deve-se evitar achar que isso é a principal tarefa de um empreendedor ou a que ele deve mais ocupar o seu tempo, até porque tenho a segunda recomendação:

2) Empreendedores de empresas menores, mas com potencial de crescimento, ocupam a maior parte de seus tempos com a execução, por escassez de recursos, e porque se eles quiserem crescer, precisam liderar, cuidar, ter certeza de que seu negócio está tomando o caminho que precisa tomar.

Empreendedores que conseguiram criar grandes negócios de impacto foram, de certa forma, obcecados com a execução, aprendendo enquanto realizavam, corrigindo rumos enquanto aprendiam.

É interessante observar que mesmos companhias estabelecidas estão adotando práticas cada vez mais parecidas com as de pequenas empresas com potencial de crescimento. Práticas como o MVP (Minimal Viable Product) são um bom exemplo de como a tradicional “tentativa e erro”, muito comum entre empreendedores que cresceram seus negócios, foi estruturada para que grandes corporações sejam flexíveis e inovadoras como as startups.

Mas toda história tem um outro lado. Voltando ao exemplo do nosso empreendedor de saúde. Acompanhei seu negócio por quase dois anos. Ele era uma apaixonado por criar novos produtos e soluções no seu campo de atuação. Tudo que ele inventava era fantástico. E, como falei, ele tinha clara consciência do que deveria ser o foco de sua organização. Mas ele não conseguia se desvencilhar da sua fascinação em criar novos produtos e, naturalmente, como ocorre com empresas neste estágio de crescimento, a maior parte da atenção se voltava a isso.

Nesses dois anos, por mais claro que estivesse que a área comercial deveria ter mais atenção, as pessoas contratadas, os sistemas necessários, o foco na evolução da prática de vendas, nunca eram a prioridade. Como resultado, a receita cresceu marginalmente, e os custos aumentaram bastante, devido aos investimentos necessários para produzir e lançar novos produtos.

Empreendedores, como diz o título dessa série de artigos — Como a personalidade do empreendedor afeta o negócio –, são a principal causa da limitação do crescimento dos seus negócios, e não necessariamente a estrutura. Organizações como as que citei são extremamente dependentes de seus fundadores, e a cultura dessas empresas reflete a personalidade deles.

Entenda em que áreas do seu negócio focar para crescer

Então vem uma nova recomendação:

3) Não basta mudar a estrutura para pensar mais na estratégia. O empreendedor precisa entender qual deve ser sua atitude para que o foco esteja onde precisa. Exige sacrifícios, como no caso acima, de colocar sua paixão (inovar) em plano diferente por um momento (não precisa parar) até que a organização adquira uma nova competência.

Obviamente, a estrutura organizacional é fundamental para que a organização cresça de forma sustentável, com recursos alocados e responsabilidades claras para todos da organização. Mas mesmo estruturas organizacionais podem ser distorcidas pelas relações afetivas do empreendedor, como citei no primeiro artigo dessa série (Qual a melhor estrutura organizacional para minha empresa crescer).

A personalidade e as paixões do empreendedor (e não a estrutura) têm um poder muito maior de tirar o foco daquilo que precisa ser feito na organização — e não só “pensar na estratégia”.

Algumas orientações podem “proteger” o empreendedor dele mesmo:

1. Mentores e outros empreendedores são excelentes fontes para se discutir o caminho que a empresa está tomando e entender quais são as escolhas que o negócio possui. Mas a escolha é sempre do empreendedor. Envolver os gestores da empresa na hora de definir as escolhas não garante, mas ajuda muito, caso o empreendedor escolha em focar nas suas escolhas.

2. Desenvolva governança pessoal e na empresa mínima para manter o foco no que é importante. Para a empresa, definir metas, prazos em relação ao foco e ter reuniões regulares para checar a evolução são essenciais. As reuniões mais produtivas são normalmente curtas (até 1 hora) e diretas ao ponto. Para o empreendedor, coloque na sua agenda ligações ou rápidas visitas regulares (se possível diárias) aos gestores-chave para checar se estão precisando de suporte na execução. A intenção não é controlá-los no detalhe e criar clima de desconfiança, mas sim manter o foco e a relevância dele no dia a dia.

3. Dependendo do tamanho da empresa, Conselhos Consultivos são uma ótima opção para manter o empreendedor consciente das prioridades da sua organização (e não só das suas). Obviamente o perfil dos membros é fundamental. Trazer alguém que em toda reunião inventa algo novo a ser implementado pode ser uma armadilha.

Fonte: Endeavor