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Gestão & Liderança Postado em quarta-feira, 09 de agosto de 2017 às 20:45
Nos anos 1960, o norte-americano Theodore Levitt, professor da Harvard Business School, virou as organizações de cabeça para baixo ao lhes perguntar em que negócio estavam. Ele ensinou que a indústria de ferrovias ruiu não porque surgiu a indústria automobilística, e sim porque as companhias do setor não entenderam que estavam no negócio de transporte, não no ferroviário. Para terem sucesso, segundo Levitt, as empresas precisavam parar de pensar em produto e focar o uso dele.

Em plena década de 2010, o brasileiro Lourenço Bustani, jovem líder da fi rma de consultoria Mandalah que foi incluído entre as pessoas mais criativas do mundo dos negócios pela revista Fast Company, parece propor uma transformação parecida, com seu conceito de inovação consciente. Para terem sucesso hoje, segundo Bustani, as empresas precisam entender não só em que negócio estão, mas também os diversos impactos que ele causa e inovar aí. “Isso não é mais conversa periférica”, diz.

Nesta entrevista exclusiva a HSM Management, ele explica o que é inovação consciente –“só pode ser considerado inovador aquilo que necessariamente melhora a vida das pessoas”– e conta como tem visto as empresas mudarem nessa direção.

O que a Mandalah faz? 

Fazemos com que as empresas entendam que toda a sua atividade de geração de valor tem consequências no curto, médio e longo prazos. São consequências ambientais, sociais, culturais, políticas, econômicas e podem ser positivas ou negativas.

A maneira como se tem feito negócios nas últimas décadas é dissociando valor e impacto, e é isso que explica o contexto de completo desequilíbrio que vivemos. Não existe divisão entre valor e impacto.

Como valor e impacto podem voltar a integrar-se?

A partir do momento em que as pessoas começam a enxergar o impacto tanto quanto o valor, elas se sensibilizam e reveem suas ações para que sejam menos devastadoras. É quando cai a ficha e os gestores percebem que não dá mais para viver em um contexto em que poucos ganham e muitos perdem.

Impactos não deveriam ser assunto de governo? 

O setor privado foi o local que escolhemos para essa reflexão, pelo modo como movimenta os mercados, impacta o meio ambiente, emprega pessoas e forma cultura.

Mas também é assunto de governo, e até por isso lançamos um braço de políticas públicas em 2014. Quanto mais essas esferas andarem juntas, maior a chance de sucesso.

Como gerar reflexão em gestores de uma montadora?

Mostramos que, em uma cidade como São Paulo, não se pode ficar “cuspindo” veículos com motor a combustão sem ter consciência sobre as limitações de infraestrutura, sobre a poluição, a insegurança, o trânsito.

Quando o gestor da montadora enxerga que atua em um ecossistema muito maior do que o formado pelo veículo e pelo motorista e que precisa melhorar a vida das pessoas, ele começa a inovar de outro jeito. A empresa deixa de ser de motores para ser de mobilidade.

Theodore Levitt do século 21… Vocês já fi zeram 70 projetos de inovação consciente. Essas empresas mudaram?

As crises nos ajudam, sabia? Antes da crise de 2008, por exemplo, nossas ideias eram vistas como um plano B, e viramos plano A de repente. A visão sistêmica tornou-se quase uma exigência.

Como vemos que os impactos são uma nova variável levada em conta nas decisões?

Notamos, por exemplo, que há uma nova composição de equipes, com mais gente tendo essa mentalidade.

As estruturas começam a mudar também.

E passamos a ser recebidos de maneira cada vez mais atenciosa nas empresas, o que permitiu à Mandalah crescer e internacionalizar-se.

Os gestores não acham vocês “santinhos” demais?

Ninguém na Mandalah é “santinho”; ninguém quer converter as pessoas ao bem.

Queremos ajudar os gestores a conciliar sua busca do lucro, e de outras questões pragmáticas, com suas buscas individuais, como a de contribuir para a saúde e a alegria das pessoas.

Mesmo entre os executivos mais céticos, existem os que querem deixar um legado de que se orgulhem e por uma série de fatores ainda não conseguiram fazer isso. Mas, inoculado o “vírus da consciência” nos gestores, a coisa anda.

Você falou da montadora hipotética, mas tem a General Motors como cliente. Como a coisa tem andado lá?

É interessante, porque nossa relação com a GM começou, em 2008, com eles incomodados conosco, porque dissemos que seu negócio estava se tornando o cigarro do século 21. Mas foi aquele tipo de incômodo que aproxima, não que distancia, sabe? Do tipo “isso é uma verdade que eu não queria ouvir, porém sei que tenho de ouvir, então fale-me mais a respeito”.

Não estou dentro da GM no dia a dia, mas o que testemunho é que muitas mentalidades mudaram ao longo dos projetos que fi zemos, e isso acabou influenciando decisões estratégicas da companhia.

É claro que, para conseguir mudar o percurso de uma indústria centenária e com muita inércia, como é a automobilística, vamos precisar de bem mais que meia dúzia de projetos. Mas eles já incorporaram aprendizados sobre mobilidade que os influenciam nos investimentos de longo prazo.

Outro cigarro do futuro são as bebidas alcoólicas. Conte um pouco de seu projeto para a AB InBev, por favor.

Fomos contratados pela AB InBev para fazer uma reflexão a respeito de como suas marcas de cerveja podem se tornar uma força propulsora para a sociedade com base em uma metodologia que criamos, chamada Brands For Good (BFG).

O que os gestores da AB InBev fizeram foi colocar o produto de lado por um instante. Aí sobrou um território muito fértil para a inovação. Sobrou a “alma” do negócio deles, que está embutida nas marcas.

Agora esses gestores estão se perguntando o que todos os executivos deveriam se perguntar: “O que mais eu posso ser além daquilo que comercializo?”.

Fazer essa pergunta também contribui para lucrar mais?

Sim, principalmente nos tempos de hoje, em que tudo o que se comercializa pode se tornar obsoleto da noite para o dia. Investindo na “alma”, você consegue encontrar e estabelecer um território mais perene para seu desenvolvimento, não replicável pela concorrência.

Os gestores não dizem que há um limite para o que o consumidor aceita pagar por “alma”?

Eu vejo isso de duas formas – a ética e a pragmática.

A ética é: se uma empresa grande descobre um jeito mais responsável de manufaturar e comercializar um produto e está consciente do estrago que o jeito atual causa, deve investir nesse jeito de qualquer modo, até para incentivar o resto da indústria a fazê-lo. Trata-se de um protagonismo necessário nos dias de hoje.

A argumentação pragmática? Trabalhe em cooperação com fornecedores e concorrentes para conseguir um preço mais competitivo. Não dá mais para atuar de maneira predatória como as empresas têm feito.

A experiência da Mandalah varia muito nos países em que está presente?

Vejo menos diferenças do que semelhanças. É claro que a Califórnia tem uma sociedade mais progressista e aceita mais naturalmente a inovação consciente.

Porém, de modo geral, todos estão no mesmo pé: já entenderam o que precisa ser feito, só lhes falta a ousadia de fazer.

Até os gestores brasileiros envoltos em denúncias de corrupção estão nesse pé?

No Brasil, damos respostas pragmáticas às coisas. Precisamos aprender que a questão ética precede o pragmatismo. Também precisamos aprender a pensar no médio e longo prazos; vivemos o império do curto prazo. Mas vamos aprender. Sempre que houver pessoas predispostas a mudar, poderá haver inovação consciente.

Fonte: Revista HSM
Gestão & Liderança Postado em quarta-feira, 09 de agosto de 2017 às 20:43
Se a estrutura organizacional é reflexo da visão de mundo do empreendedor, como mudar o próprio mindset para estruturar uma empresa pronta para crescer?


É interessante como somos iludidos a pensar que mudar a estrutura organizacional pode resolver todos os nossos problemas. Lembro-me de quando um empreendedor me procurou com a tradicional demanda:

“Preciso crescer e a forma como estou estruturado hoje não me permite fazer isso.”

No fundo, ele estava certo: a forma como ele estava estruturado nunca permitiria à sua empresa crescer como gostaria. Até porque, diferentemente dos tradicionais “amigogramas” ou “personogramas” de empreendedores que estava acostumado a ver, a empresa dele estava até que bem organizada. As estruturas de suporte — como Finanças, RH e Jurídico — eram bem definidas, assim como Vendas, Marketing, Logística e Produção.

Mas no final, segundo ele, nada funcionava.

Logo após as primeiras perguntas ficou claro que o que ele estava procurando era alguém — no caso eu — que validasse o que estava na sua mente, um novo “personograma”. Ele aceitou a dica de outro empreendedor e acabou estruturando sua empresa de acordo com as tradicionais práticas de gestão, sem olhar para a transformação pessoal que seria necessária para ele mesmo aceitar as mudanças.

O que aconteceu? A empresa quase parou de funcionar.

A cultura de empresas geridas por empreendedores é um reflexo de suas personalidades e visão de mundo. E as estruturas organizacionais, normalmente, também são consequências dessa visão.

Nas mentorias que participo, sempre peço para visitar a empresa e conversar com as pessoas para entender a estrutura in loco.

Para mim, essa sempre foi a melhor forma de compreender não só o negócio, mas de mergulhar no mundo interior do empreendedor.

O que eu via, geralmente, era uma projeção de como o empreendedor via o mundo, enxergava o seu negócio e se organizava para dar certo. Até então, tudo o que era prioridade, os detalhes e “insights” que transformavam as empresas em algo único, levavam esses empreendedores a chegar onde estão, porém, não os ajudariam a partir para um novo estágio de crescimento.

Entender essa realidade é o ponto-chave para pensar a estrutura desse tipo de organização.

Como sua personalidade e maneira de ver o mundo estão intrinsecamente associadas à forma como a empresa funciona, rompê-la significa romper com a estrutura psicológica do empreendedor que se vê na sua criação.

Como no caso acima, mover uma organização para uma estrutura padrão de mercado traz consigo o risco de quebrar a lógica do empreendedor e, mais do que isso, põe em risco elementos que trazem diferenciação para a empresa — que foram definidos e organizados de acordo com o processo interior do empreendedor e não estão explícitos em processos, como no caso de uma empresa estabelecida e mais madura.

Estabelecer uma estrutura organizacional, nesse caso, significa compreender como seu criador a organizou ao longo do tempo, agregando conceitos de gestão já provados, mas que respeitem ou melhorem a intenção do que foi criado .

Não é uma tarefa tão simples e requer alguma experiência com organizações. Mas seguem algumas dicas que podem ser úteis quando você estiver enfrentando um desafio parecido:

Primeiro, compreenda o negócio sob a ótica do empreendedor.Se você é o empreendedor, peça ajuda a profissionais e consultores para gastarem um tempo entendendo seu negócio e depois o explicando para você.  Empreendedores sabem intuitivamente detalhes relevantes de como operam, mas têm dificuldade de explicitá-los. Por isso, pessoas não próximas podem ajudá-los bastante a explicar e enxergar suas próprias criações.

Desenhe o que existe hoje.Ou peça para desenharem, se você é o empreendedor, a estrutura organizacional que está atualmente funcionando e que explica a lógica de como a organização opera. Não se preocupe com o que virá, usualmente é uma loucura.

Conte essa história.Ou peça para contarem, se você for o empreendedor, como se fosse uma estória, a lógica do negócio, usando o organograma que foi desenhado. Esse geralmente é um momento de revelações em que, muitas vezes, o próprio empreendedor percebe falhas e equívocos e tem insights, favorecendo o resto do trabalho.

Se a explicação fizer sentido para todos, estamos no caminho certo.

Comece, então, a mapear:

Os pontos críticos: aqueles que merecem atenção para manter os diferenciais da empresa e que fizeram ela ser o que é; ou que são gargalos de crescimento e que estejam subdimensionados no sistema;

Áreas convergentes: áreas que requerem habilidades semelhantes ou que lidam com um mesmo público e que, normalmente, operam de forma diferente.

Comece a desenhar uma nova estrutura que :

* Contenha o roteiro definido acima * Inclua os insights já acolhidos pelos empreendedores que estão à frente do negócio: * Inclua práticas de gestão bem-sucedidas e que possam impulsionar os diferenciais e reduzir gargalos; * E que possa ser convertido em processos, com claras definições de responsabilidade e indicadores de performance. * Fique atento para entender que partes da estrutura terão uma transição mais difícil e quais são os pontos que exigirão mudanças de hábitos do empreendedor (e da turma operando atualmente que também lutará para manter o status quo).

No final, a estrutura organizacional deve fazer sentido para o empreendedor. Ele tem que sentir que a estória original está ali e ter consciência do que requer mudança de seus hábitos e dos da sua equipe. Uma outra conversa é como fazer essa estrutura funcionar da forma como elaborada. Mudanças são bem conhecidas pela resistência que trazem para aceitá-las. Papo para um outro artigo. Até a próxima!

Fonte: Endeavor