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Varejo & Franquias Postado em terça-feira, 06 de fevereiro de 2018 às 21:24
O processo de compra nunca foi tão complexo e desafiador para o varejo. O setor se prepara para entrar, de uma vez por todas, na era ‘everywhere’, em que o crescimento das compras acontece em todos os canais, on-line e off-line, demandado uma experiência cada vez mais fluída entre todos estes meios e momentos. E, nesse sentido, usar os dados para compreender a jornada do cliente, conhecer características de produtos e serviços, e dominar processos de operação do varejo é essencial, embora demande uma estratégia de análise e inteligência muito bem definida.

Os surgimentos de e-commerces, aplicativos móveis e marketplaces resulta da mudança cultural no comportamento e necessidade do consumidor em sua busca constante por ultra conveniência, ultra flexibilidade e ultra socialização. O conceito de omnicanalidade que obriga os varejistas a criar canais físico digitais (e não apenas físicos ou somente digitais) responde muito bem a estas novas demandas, e analistas de mercado e eventos especializados no setor já apontam para uma realidade cada vez mais híbrida entre o antigo e o novo. Enganou-se quem resolveu acreditar e apostar apenas em uma tendência, seja ela conservadora ou futurista.

Mesmo que a facilidade de comprar produtos do conforto do sofá ou da mesa de casa seja o que diferencia o e-commerce da loja física, o que o comércio on-line não proporciona sozinho – e é um dos grandes fatores de sucesso do varejo físico – é a interação humana (com os produtos, com os serviços e com outras pessoas também). Quantas vezes, dentro de uma loja, o papel do vendedor foi fundamental na escolha de um produto que atende melhor às suas necessidades? Hoje é totalmente possível ter esse ambiente híbrido fisicamente (em uma loja com suporte tecnológico) ou digitalmente (em plataformas que unem realidade virtual/aumentada e chats ou bots que utilizem de inteligência artificial).

Independentemente do melhor uso da tecnologia, o fato é que ainda falta conhecimento sobre os dados – que não são poucos – disponíveis para entender o que de fato o cliente busca. Atualmente, os clientes fornecem muitas informações diferentes por uma quantidade cada vez maior de canais. O mercado percebeu que não basta mais tocar o consumidor apenas quando ele está com o celular ou o computador em mãos. Para a experiência ser ‘everywhere’ é necessário integrar todos os canais de interação (em alguns deles pode ocorrer a venda e em outros não necessariamente) e oferecer momentos positivos ao cliente.

Sem dados é impossível

Não dá para desconectar a experiência dos dados. Somente com analytics (básico, avançado, inteligência artificial, etc.) é possível dirigir as etapas da jornada do cliente, gerar insights que trarão novas perspectivas sobre o negócio, oferecer uma visão completa sobre produtos, vendas, lojas, e, com base nessas informações e insights, entender o cliente de verdade.

Embora grande parte dos executivos ainda não enxergue o potencial dos dados, nessa era de transformação digital, eles são a alma do negócio. Afinal, eles contam a história da organização e estão sempre tentando emitir alguma mensagem a partir das informações que recebem sobre o hábito de compra dos consumidores. Estabelecer uma estratégia de negócios baseada em dados aponta o ‘caminho das pedras’ para o varejista, permitindo analisar razões de ‘abandono da mercadoria no carrinho’, seja na loja física ou on-line, e pensar em ações estratégicas para minimizar os riscos e custos.

E nos próximos anos, os dados direcionarão as estratégias do varejo porque o futuro está ancorado em duas grandes tendências: internet das coisas (IoT) e Visual Analytics. Segundo o 27º relatório anual sobre tecnologias aplicadas ao Varejo da RIS (Retail Info Systems) e o estudo da Zebra intitulado “2017 Retail Vision”:

1. Internet das coisas (IoT)

É mostrada como uma das principais evoluções tecnológicas para o dia a dia do varejo. Apesar do potencial de atuação em diversas etapas, os sensores de IoT se destacam por melhorar a experiência de compra do consumidor e a excelência operacional. No entanto, segundo o estudo, apenas 35% dos varejistas investem em sensores que avisam quando um cliente específico está na loja.

2. Visual Analytics

As aplicações de Big Data estão virando realidade. Passada a fase de estudo, entendimento das possibilidades e de casos de uso pelo mercado, o varejo vem compreendendo que, na era das análises, é impossível gerenciar adequadamente um negócio sem uma fábrica de dados bem estabelecida, que informe sobre o andamento das operações e que forneça conhecimento sobre os clientes.

Muito em breve, a tendência é permitir que os colaboradores usem dashboards dinâmicos e intuitivos para que decisões assertivas sejam tomadas de forma rápida.

Integração é para todos

Com os índices e previsões apontados, fica a pergunta: os investimentos em conhecimento e tecnologia são para todos os varejistas? A resposta é sim! Mas, existem poucos resultados práticos e tangíveis relacionados a esses investimentos, por isso é preciso: ampliar o conhecimento sobre o tema; definir processos e aquisição de tecnologias, que permitam ter controle total e efetivo das operações e gerar conhecimento real sobre os clientes; e, por fim, perseguir os resultados de negócio a fim de aumentar as vendas e reduzir custos.

Fonte: Novarejo
Varejo & Franquias Postado em terça-feira, 06 de fevereiro de 2018 às 21:16
Quarenta e quatro por cento das famílias norte-americanas têm uma arma de fogo em casa e 52% são assinantes do serviço Amazon Prime. Mais famílias abastadas têm o Amazon Prime do que um telefone fixo. Metade de todo o crescimento on-line e 21% do crescimento do varejo nos Estados Unidos em 2016 podem ser atribuídos à Amazon. Mesmo para comprar em uma loja física, um em cada quatro consumidores dá uma olhada nas análises que os usuários postam na Amazon antes de fechar a compra.

Muitos bons livros foram escritos, inclusive o impressionante A loja de tudo, de Brad Stone, para contar a história de como um analista de fundos hedge chamado Jeff Bezos e sua esposa cruzaram o país de carro, de Nova York a Seattle, e bolaram o plano de negócios da Amazon na estrada. Muitos autores argumentam que os ativos essenciais da Amazon são sua enorme capacidade operacional, seus programadores ou sua marca. Eu, por minha vez, diria que as verdadeiras razões pelas quais a Amazon está conseguindo acabar com a concorrência (ao mesmo tempo em que se aproxima de uma valorização trilionária) são outras. Como os outros Quatro, a ascensão da Amazon se baseia no apelo que a empresa faz a nossos instintos. O outro fator impulsionador do sucesso da empresa é uma história simples e clara que lhe possibilitou levantar, e gastar, um capital assombroso.


Caçadores e coletores

A caça e a coleta, a primeira e a mais bem-sucedida adaptação da humanidade, ocupam mais de 90% da história humana. Em comparação, a civilização é pouco mais que um piscar de olhos recente. E a atividade é menos penosa do que parece: as pessoas da era paleolítica e neolítica passavam apenas dez a 20 horas por semana caçando e coletando os alimentos necessários para sobreviver. Os coletores, em geral mulheres, respondiam por 80% a 90% do esforço e da produção. Os caçadores forneciam principalmente uma proteína extra.

Amazon

Não deve ser surpresa para ninguém que os homens tendem a ser melhores em avaliar distâncias (devido à necessidade de saber a distância a ser percorrida até a presa). Em comparação, as mulheres costumam ser melhores em fazer um balanço de seus arredores imediatos. Os coletores também precisavam escolher melhor o que coletavam. Um tomate não podia sair correndo, mas a coletora ainda precisava desenvolver as habilidades necessárias para avaliar nuances como grau de amadurecimento, cor e formato para saber se o item era comestível, estragado ou venenoso. O caçador, em comparação, precisava agir rapidamente diante de uma oportunidade de caça. Ele não tinha tempo para avaliar nuances, só para a velocidade e a violência. Uma vez abatida a presa, os caçadores precisavam pegar a mercadoria e chegar logo em casa, já que a presa fresca e eles mesmos eram alvos atraentes para outros predadores.

Observe como as mulheres e os homens fazem compras: pouca coisa mudou. As mulheres tocam o tecido para sentir sua textura, experimentam os sapatos para ver se combinam com o vestido e pedem para ver os itens em cores diferentes. Os homens veem algo capaz de matar sua fome, o abatem (compram) e voltam para a caverna o mais rápido possível.1 Para nossos antepassados distantes, quando a caça estava segura na caverna, o monte de comida nunca parecia grande o suficiente. A ameaça de fome vinha com secas, tempestades de neve ou pragas. Pensando assim, era uma estratégia inteligente acumular mais que o necessário e uma desvantagem desperdiçar energia. Por outro lado, a desvantagem de guardar menos que o necessário era morrer de fome.

A humanidade não é a única movida pela compulsão de acumular. Para os machos de muitas espécies animais, o acúmulo se traduz em sexo. Vejamos o exemplo dos chascos-do-monte, uma espécie de passarinho das regiões secas e rochosas da Eurásia e da África. Eles acumulam pedras. Quanto maior for o monte de pedra (ou, em termos humanos, quanto mais caro for aquele apartamento em Manhattan), mais fêmeas se interessarão em se acasalar com aquele macho.12 Como a maioria das neuroses, essa começa com as melhores intenções e sai totalmente dos trilhos. Todos os anos ficamos sabendo de vários acumuladores que morreram soterrados debaixo de uma montanha de objetos acumulados no (des)conforto de seu lar. Aquele sujeito que os bombeiros encontraram debaixo de 45 anos de jornais não é louco. Ele só estava ostentando sua aptidão darwiniana aos visitantes.

Nosso lado capitalista e consumidor

O instinto é um companheiro bastante convincente, sempre observando e sussurrando no nosso ouvido, dizendo o que devemos fazer para sobreviver.

O instinto tem uma câmera, mas de baixa resolução. Ele precisa de centenas, senão milhares, de anos para se adaptar. Vejamos, por exemplo, nossa preferência por alimentos salgados, doces e gordurosos. A estratégia fazia sentido no despertar da humanidade, já que alimentos com essas características eram os mais difíceis de encontrar. Mas a situação mudou. Nós institucionalizamos a produção desses grupos alimentares com o hambúrguer e o milk-shake, que podem ser encontrados em qualquer esquina para satisfazer nossas necessidades com facilidade e baixo custo. Só que os nossos instintos não acompanharam essa mudança. Em 2050, um de cada três norte-americanos provavelmente terá diabetes.

Nosso apetite insaciável também ainda não se ajustou ao espaço limitado dos nossos guarda-roupas e carteiras. Muitas pessoas têm dificuldade de colocar comida na mesa e pagar as contas básicas. Mas milhões de pessoas estão tomando remédios para reduzir o colesterol e pagando os juros abusivos do cartão de crédito por incapacidade de controlar o instinto de acumular.

O instinto, aliado ao desejo de lucrar, leva ao excesso. E o pior sistema econômico (tirando todos os outros), o capitalismo, foi projetado especificamente para maximizar essa equação. Nossa economia e nossa prosperidade dependem em grande parte do consumo alheio.

O mundo dos negócios se baseia na ideia de que, em uma sociedade capitalista, o consumidor é o rei e o consumo é a mais nobre atividade. Desse modo, a posição de um país no mundo está correlacionada com seu nível de demanda e produção. Depois dos ataques de 11 de setembro, o conselho do presidente George W. Bush a uma nação em luto foi: “Visitem a Disney World, na Flórida, levem a família e aproveitem a vida do modo como queremos viver”. O consumo substituiu o sacrifício coletivo em épocas de guerra e crises econômicas. A nação precisa que continuemos comprando mais coisas.

Poucos setores criaram mais riqueza canalizando nosso lado consumista do que o varejo. A lista das 400 pessoas mais ricas do mundo (tirando as que herdaram a riqueza ou trabalham em finanças) inclui mais nomes do varejo do que da tecnologia. Armancio Ortega, o fundador da Zara, é o homem mais rico da Europa. O terceiro mais rico, Bernard Arnault da LVMH, que pode ser considerado o pai do luxo moderno, é dono de mais de 3.300 lojas, mais do que a Home Depot. No entanto, os sucessos mais divulgados do varejo, aliados às baixas barreiras de entrada e ao sonho de abrir a própria “lojinha”, criaram um setor repleto de ofertas e, como a maioria dos setores, num estado de constante fluxo. Vejamos como o ambiente do varejo norte-americano é “dinâmico”:


* As dez empresas com ações de melhor desempenho no mercado em 1982 foram: a fabricante de automóveis Chrysler, a rede de farmácias Fay’s Drug, a fabricante de brinquedos e videogames Coleco, a fabricante de trailers Winnebago, a fabricante de aparelhos auditivos e equipamentos de áudio Telex, o centro de diagnósticos Mountain Medical, a empresa de construção civil Pulte Home, a varejista Home Depot, a empresa de serviços especializados e tecnologia da informação CACI e a fabricante de equipamentos de telefonia e PABX Digital Switch. Quais delas estão na ativa até hoje?

* A Circuit City foi a empresa com ações de melhor desempenho dos anos 1980 (alta de 8,250%). Para quem não sabe, a Circuit City era uma megaloja, hoje falida, que vendia TVs e outros produtos eletrônicos, com o slogan “Aqui o atendimento foi elevado ao status de arte”. Descanse em paz.

* Dos dez maiores varejistas de 1990, só dois continuaram na lista em 2016. A Amazon, nascida em 1994, registrou um faturamento maior depois de 22 anos, em 2016 (US$ 120 bilhões), do que o Walmart, fundado em 1962, depois de 35 anos em 1997 (US$ 112 bilhões).

Em 2016, o varejo podia ser descrito como o sucesso insano da Amazon e o desastre do resto do setor, com algumas poucas exceções, como a cadeia francesa de lojas de cosméticos Sephora, o mundo do fast fashion e a marca de óculos Warby Parker. As empresas de e-commerce morrem sem alardes porque, enquanto as lojas físicas têm um rosto, as mortes no comércio eletrônico passam quase despercebidas. Um belo dia, aquele site que você costumava visitar simplesmente não existe mais… e você encontra algum outro e nunca olha para trás.

O homem que se aproxima da morte (o varejista) começa com a erosão das margens (o colesterol do varejo) e termina com incontáveis promoções e liquidações. Até dá para ganhar algum dinheiro com promoções, mas a história quase sempre termina mal. Por exemplo, com uma média de 12% mais estoque na temporada de fim de ano em dezembro de 2016, os varejistas aumentaram as vendas promocionais de 34% para 52%.

Como isso foi acontecer? Vamos dar uma rápida olhada na história do varejo. Nos Estados Unidos e na Europa, o varejo passou por seis etapas de evolução.25

A lojinha de esquina

Na primeira metade do século 20, o varejo era basicamente a lojinha de esquina. O fator mais importante era a proximidade. Você ia andando até a loja e levava o que conseguia carregar para casa e não raro fazia isso todos os dias. Os estabelecimentos de varejo em geral eram familiares e tinham uma importante função social na comunidade, disseminando as notícias locais antes da prevalência do rádio e da TV. A competência essencial desses estabelecimentos era a gestão de relacionamentos com os clientes, antes mesmo de o termo ter sido inventado. Os lojistas conheciam sua clientela e vendiam fiado com base na reputação dos clientes. Nosso caso de amor com o varejo e a nostalgia que sentimos quando um varejista abre falência (note que, quando uma venerável empresa de locação de equipamentos de perfuração de petróleo fecha as portas, a notícia não costuma ser divulgada nos jornais) se devem a nosso carinho histórico pelo varejo, que tem profundas raízes em nossa cultura.

Lojas de departamento

As primeiras lojas de departamento, a Harrods de Londres e a Bainbridge de Newcastle, voltaram-se para um novo segmento de mercado: mulheres ricas que passaram a fazer compras sozinhas, sem a necessidade de um acompanhante. Em Londres, a icônica Selfridges oferecia cem departamentos, restaurantes, um jardim na cobertura do prédio, salas de leitura e escrita, áreas de recepção para clientes estrangeiros, uma sala de primeiros socorros e vendedores experientes. Os vendedores eram treinados e pagos usando um novo conceito: a comissão de vendas. A noção de se diferenciar pelo atendimento e de se tornar amigo temporário e guia de compras do cliente descortinou novos horizontes. O novo conceito humanizou o varejo de grande porte e redirecionou o investimento para o capital humano nas lojas. Depois da Selfridges, essas verdadeiras celebrações da arquitetura, iluminação, moda, consumismo e da comunidade se espalharam pela Europa e pelos Estados Unidos.

As lojas de departamento também reinventaram a relação entre empresas e consumidores. Tradicionalmente, as empresas voltadas aos consumidores assumiam um papel paternalista, recomendando aos clientes o que era melhor. A igreja, o banco ou a loja controlavam as rédeas da relação. O cliente deveria agradecer por ser abençoado com o fruto da sabedoria coletiva dessas instituições. Harry Selfridge cunhou o lema “o cliente tem sempre a razão”, uma frase que na época pode ter soado fraca e subserviente. Na verdade, a ideia era profunda e abrangente. Afinal, quatro dos cinco varejistas sobreviventes mais antigos são lojas de departamento: Bloomingdale’s, Macy’s, Lord & Taylor e Brooks Brothers.

O shopping center

Quando os Estados Unidos se aproximavam da metade do século, o automóvel e a geladeira nos deram a possibilidade de percorrer maiores distâncias para obter mais coisas que poderiam ser armazenar por mais tempo. Os avanços na distribuição levaram a redução de visitas a lojas, lojas maiores, uma seleção mais variada e preços mais baixos. As lojas de departamento evoluíram e se transformaram em shopping centers. Também graças ao automóvel, houve uma explosão de empreendimentos residenciais nos subúrbios. As empresas de construção passaram a oferecer aos consumidores várias lojas diferentes reunidas em um único local pontilhado com praças de alimentação e salas de cinema. Os shopping centers assumiram o papel do calçadão comercial dos subúrbios, que não tinham um epicentro claro. (Nunca entendi por que a população da pequena Short Hills, no estado norte-americano de Nova Jersey, se orgulha tanto do shopping da cidade. É como ser dono de uma franquia da rede de restaurantes Quiznos, especializada em sanduíches frios: é melhor que ninguém saiba.) Em 1987, metade das vendas do varejo nos Estados Unidos era feita em shopping centers.

Mas, em 2016, a imprensa empresarial lamentou a morte dessa instituição norte-americana. Quarenta e quatro por cento da receita dos shopping centers norte-americanos se concentraram em apenas uma centena de locais e as vendas por metro quadrado despencaram 24% na última década.28 A saúde de um shopping center é mais um reflexo da economia local do que do formato de varejo. A decadência suburbana levou à queda de muitos shoppings. Mesmo assim, muitos continuaram a prosperar, especialmente os que apresentam boas ofertas, uma boa seleção de lojas, estacionamento e proximidade do quartil superior de famílias de alta renda.

A megaloja
O ano de 1962 nos trouxe o primeiro norte-americano a orbitar o planeta, a crise dos mísseis de Cuba, A família Buscapé… e o Walmart, a Target e o Kmart.

O varejo de megalojas proporcionou uma grande mudança nas normas sociais e revolucionou o formato do varejo. A ideia de comprar no atacado e repassar a economia aos consumidores não é, por si só, revolucionária. A mudança mais importante foi o fato de os Estados Unidos, como nação, terem decidido levar o consumidor para a linha de frente em todos os sentidos. Na Home Depot, o cliente pode escolher a lenha para sua lareira. Na Best Buy, ele pode escolher entre todos os televisores possíveis e levar o escolhido para casa de carro.

Fazer compras pelo menor preço possível passou a ser mais importante do que qualquer empresa ou setor específico, talvez mais importante que a saúde da comunidade em geral. A mão invisível se pôs a estapear pequenas e ineficientes varejistas por todo o território dos Estados Unidos e da Europa. As lojinhas familiares, outrora uma parte importante da vida comunitária, viram-se diante de uma imponente concorrência. A era das megalojas também testemunhou o nascimento de uma nova geração de tecnologia de infraestrutura de varejo, inclusive o primeiro scanner de código de barras, instalado em uma loja da Kroger em 1967.29

Até os anos 1960, a legislação se opunha a varejistas que oferecessem descontos para compras em grandes quantidades. Os legisladores temiam (com razão) que milhares de lojinhas locais seriam obrigadas a fechar as portas. Além disso, os fabricantes normalmente definiam os preços que os varejistas podiam cobrar pelos produtos. O que acabava acontecendo é que os descontos não passavam de uma arma limitada e ineficaz.

Por várias razões, incluindo margens em queda e concorrência crescente, as lojinhas de bairro perderam a proteção nos anos 1960 e a grande “corrida para o zero” teve início. Hoje, na página inicial da H&M, é possível encontrar um vestido de mangas compridas e gola alta por apenas US$ 9,99. Pelo mesmo preço, você também pode comprar um suéter masculino de tricô. Esse preço é baixo não só na moeda atual, mas também na moeda de 1962, representando uma conquista impressionante e um testamento à corrida altamente competitiva para derrubar os preços.

À medida que os grilhões caíam por terra, os monstros varejistas mais ou menos gigantescos geraram uma riqueza de centenas de bilhões de dólares. Os próximos 30 anos viram surgir desse formato a empresa mais valiosa e o homem mais rico do mundo na época, Sam Walton, sem falar da ideia de que o consumidor passou a reinar supremo. As pessoas lamentam a máquina destruidora de empregos que é a Amazon. Mas o gângster original foi o Walmart. A proposição de valor era clara e irrefutável: quando você compra no Walmart, é como se tivesse alcançado uma promoção no trabalho. Sua vida melhora e você passa a ter condições de comprar tudo do melhor, de cerveja a sabão em pó.

Varejo especializado

O Walmart foi o grande nivelador. Mas a maioria dos consumidores não quer ser igual a todo mundo. Nós queremos ser especiais. E uma boa parcela da população consumidora está disposta a pagar a mais por essa atenção especial. Essa parcela também tende a ser composta pelos consumidores que detêm a maior renda.

A marcha em direção ao “mais por menos” criou um vácuo para os consumidores em busca de expertise e de produtos cobiçados. E assim surgiu o varejo especializado, que possibilitou aos consumidores mais ricos adquirir uma marca ou produto exclusivo, independentemente do preço. Entre as empresas que se dedicaram a esse consumidor estão a Pottery Barn, a Whole Foods e a Restoration Hardware.

A economia forte também ajudou. Estamos falando dos prósperos anos 1980 e os jovens profissionais urbanos encontraram nessas lojas especializadas sua casa fora de casa, palácios do prazer onde eles podiam comprar itens para sua casa e seu guarda-roupa que expressavam seu refinamento e sofisticação. Era possível encontrar a peça certa de presunto em uma loja que não vendia nada além de presuntos cozidos em mel ou comprar a vela perfeita numa loja que só vendia velas (a Illuminations). Muitos desses varejistas especializados fizeram uma transição quase perfeita para a era do e-commerce, já que muitas já vinham conduzindo experimentos no mercado de catálogos de mala direta.

O varejista que realmente definiu a era do varejo especializado foi a The Gap. Em vez de gastar em publicidade, a The Gap investiu na experiência dos clientes em suas lojas, tornando-se a primeira marca de estilo de vida. Você se sentia especial fazendo compras na The Gap, e comprar um sofá na Pottery Barn deu a toda uma geração de norte-americanos a sensação de que eles finalmente tinham “chegado lá”. Os varejistas especializados sacaram que até as sacolas da loja ofereciam um benefício de autoexpressão aos clientes. Com uma sacola da Williams-Sonoma, uma loja de alimentos gourmet e utensílios de cozinha de qualidade profissional, você mostra ao mundo que é sofisticado, que aprecia o melhor que a vida tem a oferecer e que adora cozinhar.

A oportunidade do e-commerce

O varejo foi mais um produto de Jeff Bezos do que Jeff Bezos foi um produto do varejo. Em cada uma das eras precedentes do varejo, pessoas brilhantes se beneficiaram de uma mudança nos fatores demográficos ou nas preferências dos consumidores e criaram bilhões de dólares em valor. Mas Bezos viu uma mudança tecnológica e usou-a para reconstruir o mundo do varejo de cabo a rabo. O e-commerce jamais seria o que é hoje se Bezos não tivesse contribuído com sua visão e seu foco.

Na década de 1990, o e-commerce era um mercado insignificante, sem grandes recompensas para praticamente todas as empresas que só operavam na internet (e ainda é). O segredo do sucesso no e-commerce não era a execução, mas a capacidade de criar uma badalação em torno do potencial de uma empresa e em seguida vendê-la a algum ricaço otário antes de o castelo de areia desabar. O exemplo mais recente são os sites de promoções flash – sites que prometiam promoções incríveis, mas apenas em horários não especificados. A imprensa pirou. Consegue perceber o padrão? Badalação e vendas são duas coisas diferentes.

O varejo pode nunca ter sido, pensando nos riscos envolvidos, um bom negócio. Mas era um mercado muito menos terrível antes de o grande tubarão branco varejista de Seattle chegar e se pôr a devorar tudo o que via pela frente. Na última década, a capitalização de mercado dos ícones do varejo do século 20, da Macy’s à JCPenney, variou de terrível a desastrosa. O capital investido em cada setor é limitado, e a visão e a execução da Amazon absorveram grande parte do investimento do varejo. O resultado é um setor, antes densamente povoado, sendo devastado, com sua população sendo extinguida por um único player.


Como vivemos em uma cultura de consumo, a trajetória natural do varejo é ascendente. Assim, quando os planetas se alinham e um novo conceito se revela eficaz, ele pode subir rapidamente e criar um enorme valor tanto para os consumidores como para os acionistas. O Walmart de fato deu às pessoas acesso a uma vida melhor, ou pelo menos uma vida mais materialista. E você de fato pode se sentir melhor consigo mesmo usando sapatos de couro de corte exclusivo da Zara e fazendo suco com uma sofisticada centrífuga da Williams-Sonoma.

A diferença é que esse valor foi criado a uma velocidade sem precedentes por uma única empresa, porque, por ser virtual, a Amazon pode crescer em milhões de clientes e em praticamente todo o setor de varejo, sem o estorvo tradicional de ter de abrir lojas físicas e contratar milhares de funcionários. Bezos se deu conta de que no site da Amazon todas as páginas podem ser lojas e todos os clientes podem ser vendedores. E que a empresa poderia crescer tão rapidamente a ponto de não sobrar um canto sequer no mercado para os concorrentes cavarem um nicho.

O homem que está a caminho de ser o mais rico do planeta

Na primeira explosão de crescimento das ponto.com, Jeff Bezos não passava de mais um fugitivo do mercado financeiro formado em ciência da computação e fascinado pela promessa do e-commerce.
Mas sua visão e seu foco maníaco o posicionaram acima da multidão. Para sua loja on-line, lançada em Seattle em 1994, Bezos escolheu o nome “Amazon” para sugerir a escala do fluxo de mercadorias que ele vislumbrava. Mas outro nome que ele levou em consideração (ele ainda é o proprietário do URL) teria mais a ver: relentless.com (“implacável”).30

Quando Bezos abriu a Amazon, o varejo on-line não se voltava aos verdadeiros coletores porque a tecnologia limitada da internet (uma experiência sem grande apelo) tinha a sofisticação e o nível de detalhes de um Lada, a marca de automóveis russa, feia e simplória. As marcas se baseiam em dois fatores: promessa e desempenho. De acordo com esses critérios, a internet dos anos 1990 até os anos 2000 não era nada disso.

Em 1995, o e-commerce precisava oferecer uma presa facilmente reconhecível e que pudesse ser abatida e levada de volta à caverna com pouca perda de valor ou pouco risco de acidentalmente levarmos uma planta venenosa para casa. Bezos decidiu que esse animal seria… os livros.

Fáceis de reconhecer, matar e digerir. Os livros ficavam empilhados em um armazém, com a possibilidade de “dar uma olhada” dentro deles, como quem folheia um exemplar numa livraria. Alguém já tinha matado e armazenado a presa para você. Toda uma indústria (avaliações de livros) surgiu para identificar quais livros valiam a pena comer/ler, contornando a curadoria oferecida por uma loja física.

Bezos percebeu que as avaliações dos clientes poderiam se encarregar do trabalho árduo de vender os produtos. Enquanto isso, a Amazon poderia alavancar a seleção e a distribuição. Bezos não oferecia nuances como vitrines bem iluminadas, um sininho que tocava quando o cliente abria a porta da livraria, nem vendedores sorridentes. Mas ele alugou um armazém perto do aeroporto de Seattle e o encheu de livros de um jeito que facilitasse as manobras das máquinas.

No começo, a Amazon focou em livros e em caçadores (pessoas em uma missão, em busca de um produto específico). Com o passar dos anos, a banda larga deu à empresa a possibilidade de oferecer mais nuances, atraindo os coletores dispostos a navegar pelo site, ponderar as opções e tomar a decisão com calma. Bezos sabia que poderia migrar para itens que as pessoas ainda não estavam acostumadas a comprar na internet, como CDs e DVDs. Em um prenúncio da ameaça da Amazon a tudo o que nossa sociedade tem de bom, o CD de Susan Boyle I dreamed a dream quebrou recordes de vendas na plataforma.

Para deixar os concorrentes para trás e reforçar o valor central da seleção, a Amazon lançou o Amazon Marketplace, deixando a terceiros a tarefa de preencher a cauda longa. Os vendedores ganharam acesso à maior plataforma e à base de clientes do e-commerce e a Amazon conseguiu expandir suas ofertas sem incorrer nas despesas de manter estoques adicionais.

Hoje a Amazon Marketplace responde por US$ 40 bilhões, ou 40%, das vendas da Amazon.31 Os vendedores, satisfeitos com o gigantesco fluxo de clientes, não sentem necessidade alguma de investir nos próprios canais de varejo. Enquanto isso, a Amazon coleta os dados e pode entrar em qualquer negócio (começar a vender ela mesma os produtos) assim que uma categoria se mostrar atraente. Desse modo, a Amazon pode decidir oferecer diretamente “decalques de anciões orientais”, “fronhas com estampas do Nicolas Cage” e “galões de 100 litros de vaselina”.

A Amazon oferece um grande apelo a nossos instintos de caçador-coletor de acumular coisas com o mínimo de esforço. Nós adoramos acumular coisas, já que a sobrevivência era garantida ao homem das cavernas que tivesse mais galhos, as rochas certas para abrir coisas e conseguisse a lama mais colorida para desenhar nas paredes para que seus descendentes soubessem o melhor momento de plantar ou os animais a evitar.

A necessidade de acumular coisas é concreta. As coisas nos mantêm aquecidos e seguros. Elas nos permitem armazenar e preparar comida. Ajudam-nos a atrair parceiros e a cuidar da nossa prole. E as coisas de fácil acesso são as melhores porque consomem menos energia e nos deixam tempo para fazer outras coisas importantes.

Livre da necessidade de manter lojas físicas dispendiosas, Bezos pôde investir em armazéns automatizados. Escala é poder, e a Amazon foi capaz de oferecer preços baixos que nenhuma loja física tinha como bancar. A empresa disponibilizou promoções atraentes para clientes fiéis, autores, empresas de entrega e revendedores que concordavam em divulgar anúncios da Amazon em seus sites. E, com isso, conseguiu atrair cada vez mais parceiros para a Amazon. Com o tempo, Bezos saiu do mundo dos livros e DVDs para vender… tudo. Esse tipo de experimentação e agressão é o que os militares chamam de ciclo do “observar, orientar, decidir e agir”. Ao agir com rapidez e decisão, você força o inimigo (no caso, outros varejistas) a reagir à sua última manobra enquanto você já está entrando na próxima. No caso da Amazon, isso foi feito com um foco implacável no consumidor.

Outro fator que ajudou, pelo menos na maior parte dos primeiros 15 anos de existência da Amazon, foram os CEOs do varejo tradicional afirmando que o e-commerce representava apenas 1%, 2%, 3%, 4%, 5%, 6% … do varejo. Nunca houve uma reação coordenada à ameaça até que a Amazon tivesse caninos enormes e um capital ilimitado… só que aí já era tarde demais.

Em 2016, o varejo nos Estados Unidos cresceu 4% e o Amazon Prime cresceu mais de 40%.32,33 A internet é o canal de mais rápido crescimento da maior economia do mundo e a Amazon domina a maior parte desse crescimento.34 Na importantíssima temporada de fim de ano (novembro e dezembro de 2016), a Amazon conquistou 38% das vendas on-line. Os próximos nove maiores players on-line juntos ficaram com apenas 20%.35 Em 2016, a Amazon foi considerada a empresa mais respeitável da América.36

Soma zero

Com o crescimento do varejo basicamente paralisado em toda a economia norte-americana, o crescimento da Amazon deve estar vindo de algum lugar. Quem está perdendo? Todo mundo. O gráfico abaixo, que descreve o valor das ações dos principais varejistas norte-americanas (de 2006 a 2016), diz tudo:



Lojas demais, salários congelados, mudanças nas preferências dos clientes e a Amazon criaram uma tempestade perfeita no varejo.

Hoje, a maioria dos varejistas está sendo bombardeada. A maioria, mas não todos.


A Amazon tornou-se o Príncipe das Trevas do varejo, ocupando uma posição sem igual, inversamente correlacionada com o resto do setor.

Tradicionalmente, as ações de empresas do mesmo setor são negociadas em sincronia umas com as outras. Mas isso não acontece mais. Os mercados de ações passaram a acreditar que o que é bom para a Amazon é ruim para o varejo em geral e vice-versa. É uma situação quase inigualável na história empresarial. E acabou se transformando em uma profecia autorrealizável, já que o custo de capital da Amazon cai, enquanto o custo de capital de todos os outros varejistas aumenta. A realidade pode mudar, mas a Amazon sempre vai sair ganhando, por estar jogando pôquer com dez vezes mais fichas. A Amazon tem o poder de tirar todos os outros do jogo.

A gigante pode se preocupar quando as pessoas começarem a perguntar se o que é bom para a Amazon não seria ruim para a sociedade. É interessante notar que, mesmo enquanto alguns cientistas e magnatas do setor da tecnologia (Stephen Hawking e Elon Musk) expressam abertamente sua preocupação com os perigos da inteligência artificial e outros (Pierre Omidyar e Reid Hoffman) financiam pesquisas para investigar o assunto, Jeff Bezos está implementando a robótica na Amazon o mais rapidamente que pode. A empresa aumentou 50% o número de robôs em seus armazéns em 2016.

Com o anúncio da Amazon Go, uma rede de lojas de conveniência sem caixas, a empresa entrou no negócio de lojas físicas. Mas com uma surpresinha: os clientes das primeiras lojas de conveniência Amazon Go podem comprar itens simplesmente saindo da loja. Sensores escaneiam as sacolas e o aplicativo de seu celular quando você sai da loja. Você não precisa mais passar pelo caixa.

Outros varejistas, novamente pegos de surpresa, estão correndo para eliminar os próprios processos de pagamento no caixa. E quem você acha que essa última manobra da Amazon coloca em risco? Os 3,4 milhões de norte-americanos (2,6% da força de trabalho dos Estados Unidos) que trabalham como caixas.38 É uma multidão de trabalhadores, quase a mesma quantidade de professores do ensino fundamental e médio nos Estados Unidos.

Enquanto os varejistas estão correndo para reagir ao “zigue” da Amazon Go, fabricantes de hardware e em breve também marcas vão correr para reagir ao “zague” da Amazon Echo.

A Echo é um alto-falante em forma de cilindro e a Alexa é sua inteligência artificial, batizada em homenagem à Biblioteca de Alexandria.40 Alexa foi criada para funcionar como um comunicador pessoal, permitindo que o usuário toque músicas, pesquise na internet e obtenha respostas para suas perguntas. Ainda mais importante, o dispositivo eleva a acumulação a um novo patamar, possibilitando fazer compras usando um poderoso software de reconhecimento de voz. Diga: “Alexa, inclua Sensodyne no carrinho de compras” ou (o que dá uma trabalheira danada) aperte um dash button* das camisinhas Trojan41 e, em no máximo uma hora, você estará pronto para a ação. E a Alexa vai ficando cada vez mais inteligente com o uso.

O cliente ganha todas essas comodidades. E, para a Amazon, as recompensas são ainda maiores: os clientes da Amazon confiam tanto na empresa que permitem à empresa ouvir suas conversas e coletar seus dados de consumo. Com isso, a Amazon ganhará acesso a uma visão mais profunda e detalhada da vida privada e dos desejos dos consumidores do que qualquer outra empresa.

A Go e a Echo sugerem que a empresa está se aproximando das compras de zero clique em suas operações. Alavancando o big data e um conhecimento sem igual dos padrões de compra dos consumidores, a Amazon logo será capaz de satisfazer suas necessidades sem você precisar se dar ao trabalho de decidir ou fazer os pedidos. Chamo esse conceito de “prime ao quadrado”. Você pode precisar calibrar o sistema de vez em quando (menos coisas quando for sair de férias, mais coisas quando for receber visitas, menos chocolate da Lindt quando você enjoar), mas todo o resto vai funcionar como o equivalente varejista do piloto automático de um avião. Seu pedido vai chegar acompanhado de uma caixa vazia, você manda de volta tudo o que não quer na caixa e a Amazon registra suas preferências. A cada vez, você vai devolver menos itens. A Amazon se aproximou das compras de zero clique quando lançou seu serviço Wardrobe em junho de 2017, permitindo que os clientes escolham roupas e acessórios para experimentar em casa antes de decidir o que comprar. Os clientes têm sete dias para decidir e só precisam pagar depois de tomar a decisão.42

Compare isso a ir ao shopping center voltando do trabalho, procurar uma vaga no estacionamento e esperar na fila só para descobrir que eles não têm o tipo de lâmpada que você estava procurando, esperar em outra fila no caixa para comprar outros itens e enfrentar o trânsito a caminho de casa. Como o shopping center, a megaloja e a lojinha de esquina poderão competir com a Amazon? Estamos testemunhando uma grande revolução no varejo. Assim como vimos a porcentagem da população rural despencar de 50% a 4% em um século, veremos uma queda semelhante no varejo nos próximos 30 anos.43

O foco inabalável da empresa em reduzir ao máximo o atrito nas compras, alavancar ao máximo suas relações com os investidores e sua decisão de investir em B2B (serviços de plataforma para os concorrentes) colocam a Amazon na pole position no grid de largada na corrida para um trilhão. O que vai consolidar o domínio da Amazon no mundo do varejo é seu compromisso, a cada passo do caminho, pela coleta de montanhas de dados de todos os consumidores do mundo. A Amazon já sabe muito sobre nós. Logo ela saberá mais sobre nossas preferências de compra do que nós mesmos sabemos. E não vemos problema algum nisso e optamos voluntariamente por dar à empresa acesso a todos esses dados.

Storytelling  capital barato

A Amazon teve mais acesso a um capital mais barato e por mais tempo do que qualquer outra empresa nos tempos modernos. A maioria das empresas de tecnologia bancadas com capital de risco nos anos 1990 levantou menos de US$ 50 milhões antes de dar um retorno aos investidores. Em comparação, a Amazon levantou US$ 2,1 bilhões em dinheiro dos investidores antes de a empresa (meio que) sair do vermelho.44 Como a empresa tem demonstrado, a Amazon é capaz de lançar um celular, investir dezenas, talvez centenas, de milhões de dólares em desenvolvimento e marketing, ver o produto fracassar nos primeiros 30 dias e tratar o desastre todo como se não passasse de mais um quebra-molas no caminho.

Se isso não for um “capital paciente”, eu não sei o que é. Se qualquer outra empresa da Fortune 500 (seja ela a HP, a Unilever ou a Microsoft) lançasse um celular que acabasse morrendo na praia, as ações da empresa teriam despencado mais de 20%, como aconteceu com as ações da Amazon em 2014.45 Com os acionistas esperneando, os CEOs dessas outras empresas teriam cedido e se retirado do mercado para que todos da empresa aprendessem uma lição de humildade. Mas a Amazon se recusa a fazer esse tipo de coisa. Simplesmente porque, se você tiver fichas suficientes e puder jogar pôquer até o nascer do sol, mais cedo ou mais tarde vai embolsar a bolada toda.

Isso nos leva à competência essencial da Amazon: o storytelling.

Ao controlar a narrativa descrevendo uma visão grandiosa, a Amazon revolucionou a relação entre empresa e acionista. A história é contada nos meios de comunicação, especialmente aqueles voltados a cobrir o mundo dos negócios e da tecnologia. Muitos desses meios de comunicação decidiram que os CEOs do setor da tecnologia são as novas celebridades da nossa era e dão à Amazon o centro do palco sempre que a empresa quiser. Em geral, o acordo que as empresas firmam com os acionistas é o seguinte: nos deem alguns anos, dezenas de milhões de dólares e retornaremos seu capital na forma de lucros. A Amazon implodiu essa tradição, substituindo, com sua narrativa, os lucros por visão e crescimento. A história é convincente e simples, a verdadeira “dupla dinâmica” de uma mensagem eficaz.

História: A maior loja do planeta.

Estratégia: Enormes investimentos em benefícios para o consumidor que resistem ao teste de tempo: menor custo, maior seleção e entrega mais rápida.

Graças a uma taxa de crescimento que reflete um avanço constante na direção dessa visão, o mercado inflaciona as ações da Amazon e proporciona capital à empresa a preço de banana. As ações da maioria dos varejistas são negociadas a múltiplos de lucros em um fator de oito. Em comparação, a Amazon é negociada a múltiplos de 40.

Além disso, a Amazon treinou o mercado financeiro para aplicar um padrão especial a suas ações, esperando um crescimento maior, mas com lucros menores. Isso permite à empresa pegar os (consideráveis) dólares de margem bruta incremental que ganha todos os anos e reinvestir mais capital no negócio, evitando toda a chateação dos impostos. E isso, por sua vez, possibilita à Amazon cavar fossos cada vez mais profundos para proteger seu negócio.

Os lucros são para os investidores o que a heroína é para um viciado. Os investidores adoram os lucros (quero dizer, eles os idolatram).
Sim, não deixe de investir, crescer e inovar, mas não se atreva a impedir o meu barato (os lucros).

As faculdades de Administração passaram gerações e gerações pregando a cronologia revolucionária da alocação de capital da
Amazon: o mais completo desrespeito pelas necessidades de curto prazo dos investidores para atingir metas de longo prazo. Uma empresa que faz isso é tão rara quanto um jovem que deixa de ir ao baile de formatura para estudar.

A lógica normal de negócios: se pudermos pegar dinheiro emprestado a taxas historicamente baixas, recomprar as ações e ver o valor das opções sobre as ações da gestão subir, para que investir no crescimento e nos empregos que o acompanham? É uma manobra arriscada.

A lógica da Amazon de negócios: se pudermos pegar dinheiro emprestado a taxas historicamente baixas, por que não investir esse dinheiro em caríssimos sistemas de entrega? Dessa forma, garantimos uma posição invencível no varejo e asfixiamos nossos concorrentes. E podemos crescer muito e rápido.

O Walmart quer impressionar os “pais” e investe diligentemente tendo em vista o longo prazo. Mas os mercados não engolem essa maturidade da empresa de Bentonville. Na teleconferência para discutir os resultados do Walmart no primeiro trimestre de 2016, a administração informou o mercado financeiro que a empresa aumentaria consideravelmente as despesas de capital em tecnologia para “conquistar o futuro do varejo”.48

Era a decisão certa, e a única decisão, para o Walmart. No entanto, a estratégia implicava uma redução dos ganhos projetados. Pausa para crises de abstinência e vômitos. No dia seguinte, depois de apenas 20 minutos do início do pregão, o valor do Walmart no mercado financeiro perdeu o equivalente a 2,5 Macy’s: nada menos que US$ 20 bilhões.49

Ser um investidor da Amazon é como ser um viciado sem qualquer possibilidade de botar as mãos na heroína (lucros). Em todas as teleconferências para discutir os resultados com os investidores, a Amazon reforça sua visão de crescimento, minimiza a importância dos lucros e lembra seus acionistas que a empresa nunca paga dividendos. O apelo é uma visão de domínio do mundo, incluindo novas tecnologias (drones), conteúdo (filmes) e tricorders como os da Jornada nas Estrelas (Amazon Echo), os quais contam com mais adoção e badalação que qualquer eletrônico de consumo desde o iPad. É um excelente uso da técnica do storytelling, mas ao estilo de Harry Potter, quando a próxima história é ainda melhor que a original.

Vender picaretas aos mineradores

Assim como é melhor ser o dono do terreno de uma mina de ouro, também é um bom negócio vender picaretas para os mineradores.
A Corrida do Ouro na Califórnia já provou essa verdade 170 anos atrás. E a Amazon está provando que essa verdade se mantém até hoje. A Amazon é proprietária de uma lucrativa mina: a empresa divide sua receita entre as vendas de produtos de consumo no varejo (a própria Amazon e a Amazon Marketplace) e a categoria “outros”, vendendo anúncios por meio do Amazon Media Group e seus serviços de nuvem (a AWS).56

A maioria das empresas de e-commerce jamais atinge a rentabilidade e, mais cedo ou mais tarde, os investidores se cansam de uma visão que não passa de um “Bezos requentado”. A empresa acaba sendo vendida (Gilt, Hautelook, Red Envelope) ou forçada a fechar as portas (Boo.com, Fab, Style.com). Uma combinação de um ecossistema do tipo “o vencedor leva tudo”, com a necessidade de captar clientes cada vez mais rapidamente, com os custos da infraestrutura de “última milha” e com uma experiência (on-line) em geral inferior faz com que empresas que operam exclusivamente na internet sejam insustentáveis.

E essa realidade também se aplica à Amazon. Mas, apesar das dificuldades de gerar lucros com o negócio central da Amazon (e-commerce puro), o imenso valor que a Amazon entrega aos consumidores criou a marca de consumo mais bem–conceituada e respeitada do planeta.57,58

A Amazon domina o volume de vendas no e-commerce, mas seu modelo de negócio é muito difícil de ser replicado ou sustentado.

Hoje em dia, é fácil esquecer que a Amazon só gerou os primeiros lucros no quarto trimestre de 2001, sete anos depois de sua fundação,59 e nunca teve uma lucratividade estável. Nos últimos anos, as ações da Amazon têm sido negociadas com base em seu brand equity, que é alavancado para possibilitar a expansão da empresa a outros negócios melhores (mais lucrativos). Olhando para trás, a plataforma de varejo da Amazon pode ter sido o Cavalo de Troia que firmou os relacionamentos e a marca, e estes posteriormente foram monetizados por meio de outros negócios.

Embora o crescimento ano a ano do negócio de varejo da Amazon tenha variado de 13% a 20% do primeiro trimestre ao terceiro trimestre de 2015, a Amazon Web Services (a rede de servidores e a tecnologia de armazenamento de dados da varejista) cresceu de 49% a 81% no mesmo período. A AWS também cresceu para responder por uma parcela considerável do lucro operacional total da Amazon, passando de 38% no primeiro trimestre de 2015 para 52% no terceiro trimestre de 2015.60 Os analistas preveem que a AWS tem o potencial de atingir US$ 16,2 bilhões em vendas até o fim de 2017, levando o negócio a valer US$ 160 bilhões (mais do que a divisão de varejo da empresa).

Em outras palavras, enquanto o mundo ainda vê a Amazon como uma varejista, a empresa está se transformando, sem alardes, em uma empresa de serviços na nuvem – a maior do mundo.

E a Amazon não pretende se limitar à hospedagem na web. O Amazon Media Group, sozinho, deve ultrapassar em breve a receita de 2016 do Twitter (US$ 2,5 bilhões),62 tornando-se um dos maiores negócios de mídia on-line.63 O Amazon Prime, o clube mais inclusivo da América (44% das famílias norte-americanas64), oferece, por US$ 99 ao ano, frete grátis para entrega em dois dias, entrega em duas horas para produtos selecionados (Amazon Now) e streaming de música e vídeo, incluindo conteúdos originais.65 As ideias de conteúdo para séries recebem uma verba para produzir o piloto e os espectadores são convidados a votar nas que eles querem ver.

A Amazon, como qualquer outra superpotência soberana, segue uma estratégia em três frentes: ar, terra e mar. Senhor Varejista, seria possível entregar os produtos ao consumidor em uma hora? Sem problemas. A Amazon pode fazer isso para você (por uma taxa), porque banca os investimentos que você não tem condições de bancar, como armazéns operados por robôs nas proximidades de centros urbanos e a própria frota de aviões e caminhões. Todos os dias, quatro aviões cargueiros Boeing 767 transportam mercadorias da cidade de Tracy, na Califórnia, passando por um aeroporto na cidade de Stockton, nas proximidades, que tinha apenas a metade do tamanho três anos atrás, até um armazém de quase cem mil metros quadrados que nem existia há um ano.66

No início de 2016, a Amazon obteve uma licença junto à Comissão Marítima Federal dos Estados Unidos para implementar serviços de frete marítimo na qualidade de um agente de cargas. Agora a Amazon pode transportar outras mercadorias também. Esse novo serviço, apelidado de Fulfillment by Amazon (transporte de cargas pela Amazon, em português), não fará muita diferença direta para os consumidores individuais. Mas permitirá aos parceiros chineses da Amazon transportarem seus produtos em contêineres pelo Pacífico com mais facilidade e a custos mais baixos. Quanto tempo você acha que a Amazon vai levar para dominar o negócio de transporte marítimo?

O mercado de transporte de coisas (principalmente) pelo Pacífico é um negócio de nada menos que US$ 350 bilhões, apesar das margens baixas. As transportadoras cobram US$ 1.300 para enviar um contêiner de pouco mais que 12 metros levando até 10.000 unidades de mercadorias (US$ 0,13 por unidade ou pouco menos de US$ 10 para transportar uma TV de tela plana). É um negócio cruel e implacável, mas não para a Amazon. A mão de obra responde pela maior parte desse custo (para cuidar da carga e descarga dos navios e da documentação necessária). A Amazon pode usar hardware (robôs) e software para reduzir esses custos. Combinado com a nova frota de aviões da empresa, o transporte de produtos pode se tornar outro grande negócio para a Amazon.

Com drones, aviões 757 e 767, caminhões articulados, transporte marítimo pelo Pacífico e generais aposentados (sem brincadeira) supervisionando as operações logísticas mais complexas do mundo (tente abastecer submarinos que nunca sobem à superfície e porta-aviões que nunca atracam em um porto mais que duas vezes por ano), a Amazon está construindo a infraestrutura logística mais robusta da história. Se você for como eu, não tem como deixar de se maravilhar com tudo isso. Afinal, sou incapaz de manter um estoque de Gatorade na minha casa.

Lojas

O último componente da estratégia da Amazon para dominar o mundo é sua utilização de uma montanha de ativos on-line para conquistar o varejo off-line. É isso mesmo, você leu certo. Refiro-me às lojas, aquelas entidades que deveriam entrar em extinção devido à concorrência do e-commerce.

A verdade é que a morte das lojas físicas não é tão iminente quanto pode parecer. Na verdade, não são as lojas que estão morrendo, mas a classe média e, por sua vez, as empresas voltadas a atender esse grupo, que antes reinava soberano. O maior proprietário de shopping centers dos Estados Unidos é o Simon Property Group. Seus acionistas receberam um duro golpe em 2017, depois de o preço das ações atingir um pico histórico em 2016.69 Mas o Simon Group deve sair ileso, já que vendeu suas propriedades em bairros de média e baixa rendas para se concentrar só nos bairros mais abastados. Hoje, de mais ou menos mil shopping centers, as cem propriedades dos bairros mais ricos respondem por 44% do valor total dos shoppings norte-americanos, com base em vendas, porte e qualidade, entre outras métricas. A Taubman Properties, outra proprietária de shoppings de alto poder aquisitivo, informou que seus inquilinos fecharam US$ 8.608 em vendas por metro quadrado em 2015, representando um aumento de 57% desde 2005. Compare isso com a CBL & Associates Properties, que opera shopping centers voltados às classes B e C. Suas vendas por metro quadrado subiram apenas 13%, para US$ 4.024, no mesmo período.

Tudo isso para dizer que as lojas físicas não vão sumir tão cedo… dependendo da loja. E o e-commerce também. No fim das contas, os verdadeiros vencedores serão os varejistas que souberem como integrar os dois. E a Amazon quer ser essa empresa.

Fonte: Revista HSM